segunda-feira, junho 30, 2008

Pensamentos...

Vejo-te por entre pequenos pedaços de vidro, grosseiramente colados… como se as mãos de uma criança, que tenta construir um puzzle… reconheço a tua face, mesmo distorcida… mas não oiço a tua voz, não sinto o teu toque… estás longe… sei que estás… sei que estás lá…quero que os meus olhos pousem sobre a tua face… sobre as arestas, sobre os pequenos detalhes que fazem de ti quem és… mas não consigo…o sol bate-me na vista e deixo de ver…procuro-te com as mãos, tentando destruir a barreira que nos separa… quero o teu toque, quero a tua paz e tranquilidade…quero saborear do mel que te compõem, da noção de que faço parte de algo maior… que não me limito aos fracos contornos do meu ser… quero estar contigo… quero ser contigo...

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O vento uiva por entre as árvores...procuras algo sem saber bem o que...passas por rios, por águas revoltas, que não são mais que as lagrimas que conténs no teu coração... tudo és tu... a terra que pisas sem fim, que faz parte de ti, da qual são feitos os teus olhos que guardam sonhos sem fim, as tuas mãos que vão ficando calejadas pelos inumeros momentos em que recorres a elas como o teu único suporte, o teu único método de te manteres um só ser... começas a ficar cansado... as pernas não respondem... o frio entranha-se em ti...sobe pelas tuas costas e aloja-se algo no teu amago sem que percebas...os teus membros deixam de responder... a tua mente refugia-se algures em ti sem que saibas onde... o teu coração já não é... já não existe... há muito que no lugar dele tens um corpo morto... depois de batalhas travadas sem fim, de destroços de ti deixados sozinhos, como minas deixadas ao acaso num terreno bravio... não resistiu... ninguém resistiria... não és... não foste... nem nunca serás...

segunda-feira, junho 23, 2008

Taciturno

No cair da noite, o silêncio avança… como um manto negro e taciturno que se adensa à medida que conquista terreno… penso na vida… no passado…no presente que insiste em não gelar e continuamente transformar-se em passado… afinal, raios, o que é o presente? Só sei defini-lo como o momento entre o passado e o futuro… mas esse momento é tão único, tão frágil, tão inatingível que nem se pode dizer que exista… é um conceito… não passa disso… um axioma, uma hipótese que permite deduzir teorias ou realidades… para mim o presente não é nada… é um empecilho… algo inventado pelo homem que não tem a mínima utilidade… o que interessa fundamentalmente é o passado e o futuro… são estes que contam a história da vida de um homem… que lhe conferem corpo, consistência, matéria…. e o meu passado, o que conta? Sobretudo histórias que prefiro esquecer… histórias de confusão, de contos de crianças misturados com a amarga realidade… histórias que eclipsam o próprio passado… reduzem-no a cinzas… como a fenix… o senão…é que esta só tem uma vida, não renasce… basta pegar nessas mesmas cinzas, lança-las sobre a imensidão do oceano e rogar que essa infinitude de inexistência desapareça com elas… sirva de alimento aos peixes… e uma vez na vida, ou morte, neste caso…seja relevante na história de alguém...

quinta-feira, junho 19, 2008

Toques....

Sinto as mãos irrequietas... como se eu quisesse falar através delas mas não tivesse tempo ou elas não se conseguissem expressar... muitas vezes, as mãos expressam-se bem melhor que a boca... têm uma magia especial...o gesto, o tacto, a cor é algo insonoro... algo delicado, discreto... cheio de novas palavras à espera de ser inventadas, novos conceitos... conceitos que nem precisam dos grilhões da definição... e falam tanto mesmo quando querem estar caladas... revelam segredos, manias, temores, fobias... um mundo de coisas intangíveis... mas no entanto tão poderosas como uma muralha de betão... o inconsciente é a ferramenta mais poderosa que existe dentro de nós... indomável,incontrolável... e as mãos são uma das maiores janela para esse mundo.

sábado, junho 14, 2008

20080612

O vento sopra criando sombras com os ramos das árvores que dançam ao seu sabor... cria sombras chinesas que, como que brincando connosco, transformam as coisas mais simples, nas mais valiosas. A exuberância da natureza instila vida em tudo...nas pedras que, sob o sol, emanam um calor intenso... nas árvores que, de forma totalmente imprevisível, soltam pequenas flores que tocam a nossa pele, como que num gesto de carinho... oiço a água que corre, que inunda de energia a flora ao seu alcance... E em tudo isto, apenas um elemento contrasta, eu mesma... consigo sentir, consigo aperceber-me de toda a vida que me circunda, mas por alguma razão sou imune a ela... não sei se por escolha, se por destino, mas o meu ser é impermeável, estanque, frio... por isso só, triste e inatingível. E o tão vívido contraste entre o mundo que me rodeia e o meu ser só contribui para a minha total aniquilação... só me faz sentir mais estrangeira neste mundo... é como uma mancha negra de sujidade... distingue-se de forma muito mais intensa num tecido branco que num cinzento.
O que devo eu então fazer? Apartar-me da vida? Afastar-me dos passados, presentes e futuros, numa vã tentativa de fugir de mim mesma?
Entretanto a natureza não desiste, a vida não se rende... continua a deixar cair sobre o meu colo, coberto com um vestido branco, pequenas flores amarelas que são, ou eram, curiosamente, a minha cor predilecta em criança... uma... duas... três... já não consigo contar... alguém insiste em não me deixar indiferente...todos os dias tenta de diferentes formas... seguro, impassível, inquebrável... numa palavra, persistente... será ele mais que eu?

20080607

Posso afirmar que conheço bem Lisboa. Conheço as suas ruas, as suas avenidas, os seus costumes e festas. Mas será que alguma vez parei para a ouvir? Será que deixei que me contasse os segredos que encerra em sí? As histórias que as paredes, as calçadas, os lampiões guardam? Tanta história deve Lisboa conhecer...histórias de amor, de sofrimento, de conflitos, de pessoas…em suma. A natureza humana é das histórias mais ricas que existe. É extremamente complexa, extremamente condimentada...cheia de pimenta e açafrão. Séculos e séculos de pessoas certamente que deixaram marcas na cidade. Quem sabe se as ruas não são pavimentadas a esperanças e sonhos? Se as paredes não são pintadas da cor do amor, da amargura ou da alegria? E os cheiros, será que também esses contêm indelevelmente a nossa marca? A marca de desconhecidos, de anónimos cuja vida fica impregnada na cidade? E para os restantes animais? Como será Lisboa para eles? Será que tem o mesmo cheiro, a mesma textura, a mesma história? Ou é uma história completamente diferente, composta por elementos dos quais nem temos conhecimento?
E eu, que marca deixo em ti, Lisboa?

terça-feira, junho 03, 2008

Viver...



Quero viver numa fotografia…tirar uma fotografia minha e entrar lá para dentro… esquecer-me de mim… existir num pedaço de papel onde o tempo não passa, onde não há dilemas, onde não há alegria ou sofrimento excepto o que ficou registado…anseio por uma vida bidimensional onde é tão mais seguro viver… não há cheiros nem tacto… mas há cores… há uma réstia de vida… afinal, não se resume toda a vida a fotografias que se desenrolam como os grãos de areia que atravessam o estreito de uma ampulheta? Porque não então fugir para uma? Uma escolhida especialmente para esse efeito… com alegria, com melancolia, mas sem sofrimento…em que esteja de costas…defronte para uma praia e todo esse momento fique congelado para o sempre… existir para sempre… nesse cantinho de papel...

domingo, junho 01, 2008

Para trás....


O meu ser é como uma folha que cai da arvore no Outono…já nasceu, cresceu…já foi viçosa e cheia de vida…agora só o fraco caule a prende à realidade…a seiva já quase nem percorre os débeis filamentos que me mantêm como uma só estrutura…um só ser…sou morta…e a verdade que guardo em mim aumenta a distância para o abismo…para o momento em que fria, caio no meio do negrume, no meio do desespero e do esquecimento…para passar a ser lixo ou então pisada, destruída, aniquilada…depois talvez o vento me leve…talvez apague da vida todos os momentos e as memórias que me acompanharam…talvez traga mais vida ao rasto de morte deixo para trás…às folhas que me rodeavam…às arvores que me tratavam como uma filha…ao pássaro que todos os dias de manha me cumprimentava e me deixava sentir a suavidade das suas penas…que brindava a minha simples existência com um fugaz lampejo de quietude e de tranquilidade. Espero pacientemente o momento em que suavemente me desprendo do pouco que me sustêm e finalmente olho para trás e esqueço o que passei, o que senti, esqueço que alguma vez a vida fez parte da minha história…recuso-me a ter coração, a agitação que o aflige é incontrolável…sinto-me como um pequeno barco que se afunda num mar de tormenta, num mar de solidão e silêncio…de vazio de sentido…sem rumo, perdido…nem a lua tenho como companhia…nos raros momentos em que se deixou ser vista por mim, perguntei-lhe o porque de tudo isto…o porque de a vida ser assim…o porque de a felicidade ser apenas o reflexo da tristeza num espelho…uma não existe sem a outra…e respostas…essas nunca tive…não passaram de sussurros, de ruídos incompreensíveis…talvez numa tentativa de me enganar…de me fazer crer que era possível haver um depois…mas esse tempo já se esgotou…só me basta esperar o inevitável...deixar de respirar...